segunda-feira, 9 de agosto de 2010

I Hope You Don't Mind That I Put Down In Words How Wonderful Life Is While You're In the World...

A vida é um grande terminal. E é assim, irreversivelmente. Basta olharmos quantas pessoas já passaram por nós e, diversas vezes, não as notamos ou, ao contrário, quantas se tornaram elementos tão importantes que já é impossível conceber a nossa vida sem elas. Há ainda aquelas que se vão sem nem sequer conhecermos, mas que mesmo assim deixam um vazio, uma lacuna que não será preenchida, pois pessoas, diferentemente de objetos, não podem ser substituídas. Isso nunca. O ser humano tem um fim em si mesmo.

Chegadas e partidas são partes intrínsecas a esta longa caminha cujo fim é único. Todos fazemos parte de algum lugar, de alguém. É inevitável. Justamente por isso que, quando vamos embora, deixamos saudades, tristezas, melancolias, lembranças ( que podem ser boas, ruins, amargas ou doces...). Mas o que levamos de cada local em que estivemos? Talvez, levemos algum souvenir, uma fotografia. Lembro que, nos últimos dias antes de retornar ao Brasil, minha mãe excluiu todas as fotos que tínhamos da Europa. Essa era a viagem dos sonhos dela, pela qual esperou por um tempo para se concretizar, por motivos diversos. No momento em que as fotos foram acidentalmente excluídas, ela se pôs a chorar. Então fica a pergunta: será que aquelas fotos eram realmente tão importantes? Não nego que ri da situação, embora possa parecer meio cruel. Porém, aquelas fotos não significavam muito para mim, afinal, o que, de fato, ficou foram memórias. Lugares deixam saudades, pelo menos alguns... mas países, cidades são estáticos, é sempre possível retornar. E as pessoas?

Essas não são estáticas e para elas, muitas vezes, não podemos voltar. Isso, sim, é motivo para choro. Somos marcados por elas de maneira singular. A simples mudança de um amigo para uma cidade deixa-nos melancólicos, ainda que essa cidade seja próxima. Mas o fato de saber que aquele ser não estará ali, para nós, como era habitual, cria um espaço em branco. Uma tristeza. Eu bem sei disso, em minha pequena vida já experimentei bastante dessa experiência, acho. Quando tinha 10 anos saí do interior para morar na capital. Como era ainda novo, não me dei conta do que deixava para trás. Depois de 4 anos, retornei ao interior, mesmo que sofrendo e relutando muito. Reencontrei amigos antigos... consegui reatar amizades de que nem lembrava mais, conheci algumas novas pessoas. Não estarei errado em dizer que essas amizades reatadas e algumas poucas novas feitas foram uma das melhores coisas que já me aconteceu. Daí, passaram-se 2 anos e minha irmã foi morar no exterior por 1 ano. Não me despedi, porém ficou o vazio. Após mais 1 ano, eu volto a Salvador. Talvez essa tenha sido a mais difícil das despedidas. Ficaria a 400Km de meus pais e amigos. Ahh, como me fizeram falta... lembro que chorava ouvindo "Your song", porque lembrava de momentos vividos com uma das pessoas mais importantes para mim depois de minha família, Isabela. Sei que nela deixei um grande espaço também ("Olha, tem cheiro de Ítalo"). E sinto saudades. Contudo, esses são só simples exemplos pessoais e de pouco interesse a quem não os vivenciou. Tenho consciência de que há partidas mais dramáticas, mais cruéis e repentinas.

Porém, tais pessoas fizeram parte ativamente de minha vida, convivemos juntos, a saudade é facilmente explicada. O que não consigo explicar é como "gente" (desculpem-me a informalidade demasiada) que nunca sequer tive contato consegue marcar minha vida incisivamente. Alguns nunca nem troquei palavras, mas fico à espera de um momento e mesmo que esse não chegue, fico feliz com as conquistas desses "anônimos" e triste com seus fracassos. Pessoas que não sabem que existo, ou se sabem, ignoram-me. Quando da época em que fui assumir minha homossexualidade, por exemplo, um menino de São Paulo, com seu blog, foram decisivos, e o incrível é que ele nem sabe disso (sim, Sr. Cláudio DeLarge, é você). Há algum tempo, conheci alguém com quem a conversa flui naturalmente e posso ficar horas a fio conversando com ele sem notar que o tempo passa. E, mais uma vez, nunca o vi, pessoalmente. São, de certa forma, cibernéticos, virtuais; somente posso criar um imagem em minha mente e pensar "como seria assistir um aula com vc, passar uma tarde, ir ao cinema..." . Só que, se partirem, deixarão em mim saudades e, conseqüentemente, espaços em branco. E, por mais que se diga "vamos manter o contato", isso é raro de acontecer. Afinal, em terras de além-mar, as coisas mudam, conhecemos novas pessoas, vamos esquecendo aquelas passadas, mas não as substituímos.

Esse ano encontrei amizades em pessoas que antes ignorava. E sinto-me feliz e mais completo por isso. Porém, não esqueci aquelas outras que me são essenciais como respirar. Se elas se forem... uma parte de mim perderá o sentido. É assim que me sinto em despedidas, às vezes, sem sentido, fragmentado; tentando juntar pedacinhos de pensamentos e e reconstituir o todo... Contudo, o todo já não existe mais, ele se foi com aquela pessoa errante.

...

Explicação de poesia sem ninguém pedir

Um trem de ferro é uma coisa mecânica,
mas atravessa a noite, a madrugada, o dia,
atravessou minha vida,
virou só sentimento.

Adélia Prado.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Untitled

Engraçado, há coisas na vida que não podemos explicar. Coisas simplesinhas, bobas, frivolidades; mas que, de alguma forma, causam em nós algum efeito inesperado ou, então, põem-nos a pensar, refletir sobre a parte boa da vida; nada daquele conflito existencial. De forma natural, temos pensamentos ou lembranças agradáveis e, por um espaço de tempo diminuto, sentimo-nos leves e a vida torna-se agradável.

E o que são essas coisas que nos fazem sentir tão leves? Bem, não posso responder por todos, em mim, particularmente, são em geral músicas, uma conversa com alguém agradável ou uma crônica de um escritor qualquer. E isso me basta para ser mais completo, menos miserável... mais feliz! Penso na vida com alegria e visualizo um momento presente mais simplificado, nada de existencialismo exacerbado nem momentos de crises. Apenas olho para o presente tal qual ele é, sem angústias desnecessárias.

Infelizmente, há pessoas que não conseguem ver no momento presente a alegria que ele traz consigo, preferindo olhar a vida com um pessimismo ou, pior ainda, escolhendo não vivê-la da forma que desejaria. Essa pessoas fazem isso por medo. Sim, medo de não serem aceitas, medo do que o outro vai pensar e por aí vai. Afinal, desde quando é errado ser feliz? Não temos mais livre-arbítrio para escolher aquilo julgamos ser melhor para nós mesmos? Ora, cada indivíduo é livre para decidir ser feliz da forma que lhe for conveniente, e não há nada de errado nisso. Ainda que sua opção seja, à princípio, mal vista por outros.

Dancemos, cantemos, bebamos... Façamos aquilo que nos proporcione prazer sem pensar, contudo, em suas futuras conseqüência. As oportunidades na vida são únicas, e não há nada pior do que o arrependimento de não ter aproveitado "aquela chance", de não ter conhecido "aquela pessoa", de não ter dançado "naquele festival"... de ter desperdiçado um momento tão singular de que desejávamos fazer parte, mas, por temer a reação de outros, resolvemos não participar. Se a vida já nos impõe tantos limites naturais, que vêm com o avançar do tempo, por que não desfrutar ao máximo daquilo que é bom para nós? Antes parecermos ridículos para os outros por estar fazendo o que gostamos do que acharmo-nos ridículos nós mesmos por não o ter feito.

Por algum motivo, sempre fui seguro de minhas decisões e soube as conseqüências que elas teriam; obviamente, já senti dúvidas e incerteza, o que é inerente a qualquer humano. Porém tenho a plena certeza de que fui feliz em cada decisão tomada, porque fi-la de acordo com meu desejo e não permiti que aquilo que os outros iriam pensar fosse um determinante, mas uma simples variável. Não há limites para ser feliz, melhor é aproveitarmos essas oportunidades, pois as pessoas vão embora; envelhecemos e, por motivos naturais, não podemos mais bailar o tango da nossa vida como desejamos. Aproveitemos o momento.


Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio

Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podiamos,
Se quise'ssemos, trocar beijos e abrac,os e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente nao cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-as de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o o'bolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.

domingo, 16 de maio de 2010

Labirinto.

Quero achar meu lugar...quero reencontrar minha inspiração para escrever, mas não consigo. Desconheço o motivo, só não consigo mais. Sei que o que escrevo aqui é repetição. Já falei isso antes, porém sinto-me frustrado. Será que meus pensamentos e opiniões perderam-se no vento? Sou, agora, simplesmente mais uma lacuna a ser preenchida? Perdi-me no vazio contemporâneo.

Contudo, não que me render. Não vou desistir de procurar-me em outras matizes, em outros pincéis, em outras palavras e pensamentos. Preciso mudar; encontrar um lugar a que eu pertença novamente. Reencontrar-me é um objetivo que tracei e não vou abandonar. Passar por um momento de mudança é normal, afinal para "definir-se" é preciso transitar por pensamentos e experiências diversas, do contrário a vida seria enfadonha.

Todos queremos encontrar um lugar no mundo. Aquele para além do "arco-íris", onde, metaforicamente, existe um pote de ouro. Há felicidade e alegria plena. Há riqueza de espírito e realizações pessoais. Eu não sou diferente dos outros, também quero encontrar esta terra encantada, mas para isso talvez seja necessário andar por estradas tortas e subir ladeiras íngremes, quase impossíveis de serem superadas... Creio que estou começando a subir tais ladeiras, ainda bem no início, onde pensamentos se confundem.

Porém, além de confuso e no começo de uma caminhada longa, estou feliz. Momentos de indefinição trazem consigo certas alegrias que outrora me eram estranhas. Experimentar faz parte desse processo que, paradoxalmente, traz prazer e sofrimento. Confesso que aproveito bastante a parte prazerosa e tento, ao máximo, evitar a parte dolorosa, e assim crio minha felicidade em pequenos momentos que juntos formam um mosaico de sensações.

Sinto-me leve...livre. E isso é o que importa, no momento. Quero (re)encontrar-me, definir-me...para isso ainda há tempo, e, neste instante, espero que que demore mais um pouco!

quarta-feira, 21 de abril de 2010

...

Venho aqui vazio. Estou vazio. Na verdade, acho que me perdi dentro de mim e não consigo mais me encontrar. Não consigo mais me definir, não sei mais do que gosto, nem mais o que quero. Estou sem rumo dentro de mim mesmo. Estou negativista, hoje. Não se foi a chuva que me deixou assim...não sei se me tornei assim. Ando procurando os pedaços de mim que se perderam pelo caminho. Sinto-me um espelho estilhaçado. Estou inseguro, sem opinião.

Eu, sinceramente, não tenho nem mais inspiração para escrever. Talvez esteja cansado ou talvez não. Quem sabe este estado seja transitório. Espero que seja. Pela primeira vez, vejo-me fragmentado. E olhe que sempre me achei completo, tão seguro de mim mesmo.

Simplesmente não consigo escrever mais neste espaço. Há uma parte de mim que pulsa por escrever sobre algo, mas há outra que me bloqueia os pensamentos e fico vazio. É, fico assim, oco, sem nada a falar. Estou vagueando pelo meu interior...e deixo-me fluir em vários seres em busca de finitude. O problema é que encontro vários "Ítalos" em meu interior. O que quer ser grande, o que é sem ambição, o que gosta de Jazz e MPB e o que ouve Eletropop... Alguns sobrepõem-se a outros, mas estão em constante guerra.

Vejo que as palavras e pensamentos me fogem...E parecem não voltar, pelo menos não hoje, não neste momento. Sinto-me tentado a acabar o texto, porém quero continuar também. Não sei mais o que escrever...somente o meu vazio.


quarta-feira, 14 de abril de 2010

Paraíso perdido ou reencontrado?

Ao se percorrer a história das atitudes maternas, nasce a convicção de que o instinto materno é um mito. Não encontramos nenhuma conduta universal e necessária da mãe. Ao contrário, constatamos a extrema variabilidade de seus sentimentos, segundo sua cultura, ambições ou frustrações. Como, então, não chegar à conclusão, mesmo que ela pareça cruel, de que o amor materno é apenas um sentimento e, como tal,essencialmente contingente? Esse sentimento pode existir ou não existir; ser e desaparecer. Mostrar-se forte ou frágil. Preferir um filho ou entregar-se a todos. Tudo depende da mãe, de sua história e da História. Não, não há uma lei universal nessa matéria, que escapa ao determinismo natural. O amor materno não é inerente às mulheres. É "adicional".

Se devêssemos traçar a curva desse amor na França nos últimos quatro séculos, obteríamos uma sinusoidal com pontos altos antes do século XVII, nos séculos XIX e XX, e pontos baixos nos séculos XVII e XVIII.Provavelmente seria necessário inflectir a curva para baixo a partir da década de 1960, para marcar um certo refluxo do sentimento materno clássico, e fazer aparecer, conjuntamente, o início de um novo traçado de amor: o do pai. Aparentemente, o amor materno não é mais o apanágio das mulheres. Os novos pais fazem como as mães, amam os filhos como as mães os amam. Isso pareceria provar que não há maior especificidade do amor materno do que do amor paterno. Significaria que não há mais especificidade dos papéis paternos e maternos, e que se tende, cada vez mais, para a identificação do homem e dá mulher?

É verdade que, vistos de costas ou de longe, vestidos e penteados da mesma maneira, o rapaz e a moça tendem a ser confundidos. Menos peito, menos quadris e nádegas entre as mulheres. Menos músculos e ombros entre os homens. O unis-sexismo existe, pelo menos em aparência.

Do ponto de vista psicológico, já não se sabe muito bem hoje o que distingue o menino da menina. O Congresso Internacional de Psicologia da Criança realizado em Paris sobre esse tema, em julho de 1979 teve dificuldade em circunscrever as diferenças. Segundo suas conclusões, nada prova que a passividade esteja reservada às meninas, como tampouco a receptividade à sugestão ou à tendência a se subestimar. Nada prova, ainda, que o gosto da competição seja mais comum entre os meninos, nem o medo, a timidez e a ansiedade entre as meninas. Que os meninos tenham tendências dominadoras, e as meninas, uma maior capacidade de submissão. Nem mesmo que os comportamentos ditos "maternos" ou "nutritícios" sejam mais especificamente femininos do que masculinos. E, de fato, o tradicional "papai lê e mamãe costura" está em vias de se modificar. Mamãe pode ler e fazer pequenos consertos, enquanto papai troca fralda e dá a mamadeira. Ninguém mais se surpreenderá.

Significa isso que o pai é idêntico à mãe? E se assim for, que conseqüências traria isso para a criança? A essas duas perguntas fundamentais para o futuro da humanidade, ninguém pode responder com certeza. Pode-se, no máximo, levantar duas hipóteses contraditórias.

Os psicanalistas são unânimes em ver nessa identificação dos papéis uma fonte de confusão para a criança. Como, dizem eles, poderá ela tomar consciência de seu sexo e de seu papel? A quem se identificar para tornar-se adulto? A criança, menino ou menina, só adquire uma sólida estrutura mental após superar o complexo de Édipo, isto é, uma relação triangular e oposicional. Que será dela se papai e mamãe forem a mesma coisa e não oferecem mais referenciais sexuais diferenciados? E se o pai encarna indiferentemente a lei e o amor materno, conseguirá jamais a criança crescer e superar o período infantil da bissexualidade? Finalmente, se a mãe deve, segundo os psicanalistas, encarnar o amor (irracionalidade) e o pai, a lei universal, a confusão dos papéis só pode engendrar a perda de razão. Só haverá aí, portanto, um processo de desumanização, fonte de psicose e de infelicidade.

Outros, otimistas e crentes incorrigíveis no progresso humano, talvez digam o inverso. Verão no unissexismo a estrada real para a bissexualidade, ou a completeza há tanto tempo sonhada pelos homens. Recordar-se-ão do mito de Aristófanes, e daquela criatura andrógina, "dois em um", que simbolizava o poder e a felicidade humanos antes que os deuses se sentissem ameaçados e os punissem cortando-os em dois. Afinal de contas, por que o homem e a mulher de amanhã não recriariam esse paraíso perdido? Quem pode afirmar que a desordem nova criada pela confusão dos papéis não será a origem de uma nova ordem mais rica e menos coerciva?

Abstenhamo-nos de responder a estas perguntas, que são do domínio da futurologia, ou da mitologia. Mas registremos, simplesmente, o nascimento de uma irredutível vontade feminina de partilhar o universo e os filhos com os homens. E essa disposição modificará, sem dúvida, a futura condição humana. Quer prenunciemos o fim do homem ou o paraíso reencontrado, terá sido Eva, mais uma vez, quem modificou a distribuição das cartas.

Elisabeth Badinter.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Pensamento gentil de paz eterna...

Sei que faz um tempo que não posto nada aqui, neste espaço. O problema é que não tenho mais tempo para nada, nem mesmo para escrever um pequeno texto. Enfim, consegui um intervalo, hoje. Já estava com saudades. Para falar a verdade, pela primeira vez não sabia sobre qual assunto escreveria, até que me veio à mente este tema. Faço aniversário este mês, então penso na passagem do tempo, fico um pouco nostálgico e melancólico. Afinal, embora sejam poucos anos de vida, completarei 18 anos no dia 28, é inevitável notar que estou envelhecendo, e a aproximação da morte é inevitável. Podem achar ridículo uma garoto de 18 anos falar sobre velhice e morte, mas, por algum motivo, esses pensamentos têm persistido em mim.

O envelhecimento faz parte do nosso ciclo natural de vida. Nascemos, crescemos, reproduzimos e morremos. O problema é que nem todos querem seguir este ciclo tão cruel. Tenho medo da passagem do tempo. Não quero sentir minha pele enrugada, ver meus cabelos grisalhos, as retinas fatigadas e a fala lenta. Não, eu não me conformo com a idéia de que daqui a 20, 30, 40 anos não poderei fazer as coisas como as faço hoje. Sentir-se impotente diante da passagem do tempo é assustador. Somos tão frágeis; como pequenos cristais de açúcar, somos perecíveis ao tempo. Querendo ou não, todos se arrastam para o inevitável fim.

É aí que reside o pior de meus temores. Arrasto-me fatalmente para a podridão e a decomposição da matéria orgânica. O medo da morte é uma constante em minha vida. Tenho tantos sonhos irrealizados, desejos e anseios. Tenho amor e paixão pela minha vida, que foi construída em bases frágeis, meus pilares não me sustentam firmemente, e podem cair a qualque momento, deixando somente escombros. E, no final, serei apenas mais que viveu neste mundo de medos. Meus feitos, se é que eles existem, não serão eternizados. Meus sonhos não serão realizados. E, talvez, nem uma lágrima seja derramada por mim. Flores enfeitarão meu sepulcro, mas minha essencia não existirá. Então serei jogado para baixo da terra igualitária. E vermes iniciarão o processo de decomposição biológica.

É o destino de qualquer ser vivo. Morrer é essêncial, afinal, a vida eterna seria entediante. A morte nos liberta de sofrimentos, limpa mágoas, acaba com diferenças e nos torna mais humanos. Notamos nossa condição de ser vivos quando o tempo vai nos destruindo, pouco a pouco, em um movimento leve, brando, delicado. O vento que tange à face leva algo de nós que não voltará. "O tempo, esse devorador de coisas", dizia o poeta Ovídio. O tempo é impetuoso, e traz consigo somente um certeza: todos morreremos. É aterrorizador, mas ao mesmo tempo reconfortante. De alguma forma, todos seremos iguais quando nos libertarmos dessa vida cruel, que nos impõe tantas marcas, e que, paradoxalmente, amamos.

Quero viver. Quero transcender. Quero realizar...quero ter tudo, experimentar todos. Mas tenho consciência de que o ocaso não tardará. Tenho certeza de que não terei grandes feitos, de que minha vida será em vão, morrei vazio. Não levarei nada comigo, nem mesmo lembranças. Lágrimas talvez não sejam despejadas, talvez nem notem que já morri. Sou insignificante, alguém muito pequeno que deseja ser grande, porém sabe que não o será. Porém, de tudo, a verdade, inconsteste, para mim: nada em minha vida valeria a pena, se não tivesse de morrer ao final.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

( )

A contemporaneidade é fantástica. Vivemos a terceira fase da Revolução Industrial. As finanças e os meios de comunicação imperam na pós-modernidade. A rapidez e a flexibilidade marcam a nossa vida. O espaço de 24 horas que marca a duração de um dia tornou-se pequeno. É neste panorama que o homem contemporâneo, ou seja, nós mesmo, nos encontramos. Contudo o progresso que veio com a revolução técnico-científica-informacional trouxe, inevitavelmente, o vazio existencial. Há uma ruptura nas relações interpessoais, e o sentimo-nos cada vez mais ocos.

A verdade é que a vida tornou-se rápida demais. Pior, perdemos o controle que tínhamos sobre nossas vidas. As máquinas nos dominaram, e passamos a viver de maneira acelerada. Não há mais tempo para o lazer nem para fazer amizades. Trabalhar e ganhar dinheiro é o que importa, mesmo que isso custe sacrificar momentos de felicidade. Afinal, tais momento tornaram-se praticamente inúteis. A prioridade é ser bem sucedido no trabalho. Família, amigos, religião, lazer transformaram-se em obstáculos na longa caminhada ao sucesso profissional, pois necessitam de atenção. E no diminuto tempo que temos não há espaço para "encaixar" essas peças.

Toda esta conjuntura levou a uma quebra nas relações interpessoais. O computador, símbolo máximo da sociedade contemporânea, reforça este afastamento entre as pessoas e aumenta a sensação de vazio. É um verdade inconteste. Até mesmo dentro de casa, familiares agora se comunicam por mensagens instantâneas via internet. Deixamos de sair à rua para socializarmo-nos, ficamos em casa frente a um computador ou aparelho televisor. Sentimos falta de calor humano, mas não o procuramos. E o nosso espaço em branco aumenta. O mais aterrador é que tentamos preencher essa grande lacuna participando de sites de ralacionamento, o que nem de longe são capazes de substituir o contato olho a olho. Simplesmente criam a falsa idéia de que temos amigos, mas eles são virtuais e estão do outro lado do monitor. Viramos fantasmas cibernéticos.

Aí, como solução para o problema, vende-se o sexo. Claro, o sexo promove o contato entre as pessoas. Transamos com desconhecidos para suprir uma necessidade biológica, não há sentimentos envolvidos. Sexo virou banal. Temos de praticá-lo porque é essencial à vida. Mas tem de ser rápido e com o mínimo de envolvimento possível. Neste mundo tão aterefado não há espaço para sexo com amor ou algum tipo de relacionamento. Os relacionamentos são quase uma adversidade na longa estrada que tentamos desesperadamente chegar ao fim e encontrar o reconhecimento profissional. Os laços de homem a homem foram desfeitos e parecem impossíveis de se reatarem. As relações são cada vez mais perfunctórias. E nosso grande vazio aumenta, e sentimos fome.

Fome? Sim, fome. Fome amor, carinho, calor, amigos. Fome de viver. De poder se divertir sem sentir-se culpado por estar "desperdiçando" tempo. De poder procurar alguém para se estabelecer uma amizade saudável, que não seja marcada por interesses profissionais. De ter alguém para abraçar quando chegar a casa. Temos até mesmo fome de dignidade. Nossa vida perdeu o sentido, lançamo-nos em uma fossa abissal. Uma grande melancolia marca o homem contenporâneo. Temos nostalgia do tempo em que os amigos se reuniam nas ruas; na verdade, somos saudosos do tempo em que se existiam amigos, em que trabalhar era bom e divertido, mas não uma obrigação muitas vezes entediante. Temos saudade do tempo em que o mundo não era uma grande esfera cibernética e que para se comunicar com quem estava distante era necesário mandar carta, porque assim a mensagem era muito mais pessoal e carinhosa. E-mails são vazios, assim como é a contemporaneidade. Até mesmo as artes são sem significado. Tornamo-nos em um grande parêntesis, e o pior, sem nada escrito dentro.


Primeiro Motivo da Rosa

Vejo-te em seda e nácar,
e tão de orvalho trêmula, que penso ver, efêmera,
toda a Beleza em lágrimas
por ser bela e ser frágil.

Meus olhos te ofereço:
espelho para face
que terás, no meu verso,
quando, depois que passes,
jamais ninguém te esqueça.

Então, de seda e nácar,
toda de orvalho trêmula, serás eterna. E efêmero
o rosto meu, nas lágrimas
do teu orvalho... E frágil.

Cecília Meireles.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Se alguém lê esse blog, saiba que não postarei aqui até, pelo menos, o dia 12 de fevereiro. Estou viajando e, nesses últimos dias, não tive muita inspiração para escrever pensando em meus vestibulares hahauhauah. ;D

Mas quando voltar, pretendo escrever um texto sobre o PNDH-3. Acho um tema muito interessante, pensarei no assunto enquanto viajo.!

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Viver é transcender.

Vou escrever sobre um tema que já venho pensando há um tempo. Este será um texto com conteúdo um pouco mais "filosófico", contemplativo. Sei que, nas últimas postagens, afastei-me do estilo de escrever de quando comecei o blog. Mas agora tentarei voltar um pouco a minha essência. Afinal, é sempre bom poder voltar.

O início da vida sempre foi e será (pelo menos eu espero que sim) o grande mistério. Não vim aqui para dissertar sobre as diversas correntes que explicam este fenômeno, mas para falar o que é, para mim, o sentido da palavra "viver". A primeira significação que consta no dicionário Aurélio é: "Ter vida; estar com vida; existir." Uma definição muito simplista, que não traz a grandiosidade de sentido presente neste pequeno verbo de apenas duas sílabas. Todos existimos, mas pouco vivemos, como diz Oscar Wilde: "Viver é coisa rara. A maioria das pessoas apenas existem". A frase não poderia ser mais perfeita. Viver é muito mais que existir e ter as necessidades biológicas atendidas. Viver é transcender.

O homem, diferentemente de outros seres vivos, tem desejos, sonhos, dúvidas. E são esses anseios, essas incógnitas que nos movem. A noção de que a vida é curta é o que nos faz ter tantos sonhos e desejos. Queremos realizar projetos, ser felizes, livres, sentir aquela brisa gentil na face e deixa o cabelo esvoaçar. Mais que isso, procuramos ultrapassar barreiras, esforçamo-nos ao máximo para fazer aquilo que, outrora, era impossível. O desejo de realizar sonhos faz com que nos sintamos encorajados a ir além, até o limite de nossa capacidade. O homem quer estabelecer marcas, recordes. Criamos utopias para tentar alcançá-las, mesmo sabendo que são impossíveis. Porém, o fato de serem irrealizáveis faz com que nos sintamos ainda mais estimulados. É nossa grande ambição, que é tão saudável e motivadora.

Contudo, não podemos focar somente em nossos desejos pessoais. Imprescindível para aquele que vive, tanto quanto o oxigênio, é criar relações interpessoais. Faz parte de nós querer conhecer o próximo. Precisamos de alguém para nos dar colo, carinho, afeto, e até mesmo para ter desavenças. Amigos são tão importantes. Uma amizade saudável nos torna uma pessoa melhor; acreditem, sou uma prova disso. Aliás, conhecer o semelhante é o início de todo o processo criativo. É a partir desse processo de comunicação e intercâmbio com o outro que se criam símbolos, instituições, metas, constroem-se sonhos em castelos de pedra. "É impossível ser feliz sozinho" dizia, sabiamente, Tom Jobim. Aquele que é só não vive, apenas existe.

Ter vida é tão bom, tão milagroso, prazeroso. Infelizmente há os que não conseguem enxergar isso. Mas existe tanta alegria e felicidade no mundo, basta descobrir onde reside a de cada um. Ver cores, tanger, tocar, sentir texturas e experimentar matizes variadas é tão fantástico. Poder sorrir, mesmo que disfarçadamente, dá-nos prazer e uma alegria imensa, indescritível. Olhar as flores coloridas no campo e aspirar o perfume que delas exala é magnífico. Ah, chorar, sentir a lágrima cair do rosto...Momentos que palavras, imagens nunca conseguirão captar a essência e a grandiosidade, porque expressam o esplendor da condição humana. Mas o melhor de tudo é saber que estes momentos são fugazes, e que a vida é demasiadamente curta. A idéia de eternidade é assustadora, viver seria entediante se não durasse tão curto espaço de tempo.

Ter algo para se apegar, idolatrar (sem fanatismo) é, também, fonte de prazer. Trabalhar, ser independente e mais livre dá a sensação de sermos mais plenos, realizados. Isso é viver. A dor, o sofrimento, a felicidade, a liberdade, a brisa, a flor, o perfume, as texturas, tudo maravilhosamente (de)ordenado, misturando-se em matizes diversas e belas. Quero transcender; ser jogado ao vento e ao mar, e poder sorrir. "Quero, um dia, poder dizer às pessoas que nada foi em vão…/ Que o amor existe, que vale a pena se doar às amizades e às pessoas,/
que a vida é bela sim,/ e que eu sempre dei o melhor de mim… /e que valeu a pena."

sábado, 16 de janeiro de 2010

"Liberdade é pouco..."

"Liberdade, essa palavra/ que o sonho humano alimenta/ que não há ninguém que explique/ e ninguém que não entenda." Com estes versos, Cecília Meireles deixou-nos muito no que pensar. Talvez essa seja a melhor definição que se tenha dado à palavra liberdade. O dicionário é muito simplista no significado de algo tão grande. A busca pelo ideal da liberdade moveu e continua movendo a história da humanidade. A Revolução Francesa, movimento essencialmente burguês, ocorrida em 1789, é o episódio que melhor representa a luta pelo desejo de ser livre. A queda da Bastillha, o uso da guilhotina como símbolo de libertação foram marcantes. Saímos do século XVIII, e chegamos ao século XXI, no ano de 2010, e, mesmo após tanto tempo, tantas lutas, ainda não somos livres. Afinal, o que é ser livre?

É muito comum associarmos a idéia de ser livre, de ter liberdade, ao de independência. Bem, o Brasil é, desde 1822, politicamente independente. A nossa emancipação política não trouxe liberdade. Para validar a afirmativa anterior basta citar que a escravidão perdurou até 1888 (mentira, existe até hoje, mas...). E depois, quando o regime escravocrata acabou, ficamos livres? Obviamente não. Continuamos dependentes do capital estrangeiro. E hoje que temos a dívida externa paga, somos livres? Não. A liberdade plena nunca será alcançada. É um projeto irrealizável, uma utopia. E por quê? Porque necessitamos de leis que regulamentem nossa vida em sociedade. Necessitamos de limites, caso contrário, viveríamos no caos eterno.

Sinceramente, não consigo conceber uma sociedade vivendo em harmonia sem um conjunto de regras que regulamentem a vida do indivíduo em conjunto. Se hoje, mesmo tendo uma Constituição Federal e um enorme código de leis; a situação é caótica, imagine se todo esse aparato não existisse. Deixaríamos os nossos instintos primitivos aflorarem? Mataríamos por comida? Poderíamos roubar? O ser humano ao mesmo tempo em que anseia por liberdade necessita de limites e privações que são essenciais.

O problema é que, além desses limites e privações que nos são imprescindíveis, criou-se um certo padrão repressivo. E esse sim nos tira a liberdade. Os homens tem de malhar e ter um corpo cheio de músculos. As mulheres têm de se alimentar do vento, ficar demasiadamente magras. Temos de falar o português apresentado na Gramática Normativa, pois este é símbolo de prestígio. Temos de nos vestir de tal maneira, porque se não for assim, estamos feios. Temos de consumir a inutilidade. Temos de beber antes da idade permitida, fazer sexo cedo, fumar uma maconhazinha, e uma série de outras coisas. Ou fazemos isso, ou somos excluídos. E ninguém quer se sentir desprezado, então, a única solução é se render a esse padrão.

É a ditadura da contemporaneidade, não muito diferente daquela que acometeu nosso país e tantos outros da América Latina na década de 1960. A diferença é que dessa vez não lutamos contra o "inimigo vermelho do Comunismo". Dessa vez não prendemos, torturamos, exilamos ou matamos aqueles que se opõem; mas simplesmente os excluímos, olhamos com desprezo e repressão. Se desejamos a liberdade, para que criarmos tantos padrões inúteis? Será que a única liberdade que queremos é a de imprensa? Que, aliás, está cada vez pior aqui na América Latina, onde uma onda de chavismo e bolivarianismo tem se espalhado. A liberdade de credo não é respeitada, o que se vê é um degladiação entre as religiões. Cristãos condenam as práticas do candomblé, judeus e mulçumanos morrem em guerras são exemplos clássicos. Eu ainda me pergunto, existe uma instituição que tolhe mais a liberdade que a própria Igreja? Ao meu ver, não há. Para mim, Igrejas e Templos protestantes são antros de corrupção, intolerância e terrorismo (sim, estou generalizando mesmo). Basta lembrar que setores da Igreja Católica apoiaram o golpe militar ocorrido aqui em 1964. E para piorar, onde estava o moralismo católico durante a Segunda Guerra Mundial? E que os protestantes não fiquem cheios de si, a religião de vocês é tão corrupta quanto a católica. Cheia de falsos moralismos e pensamentos ridículos que eu prefiro nem citar.

Liberdade é algo inatingível. Há quem diga que os pássaros são livres e seu vôo simbolize esse ideal. O problema é que aves não têm consciência do que seja liberdade. Voam por uma necessidade biológica. Mas a imagem e sua simbologia são perfeitas, não nego. Outros dizem que somente loucos são livres. Discordo. Esses estão tão presos em sua própria loucura que não poderiam nunca o ser. Cheguei ao final do texto e não respondi a minha pergunta inicial: "afinal, o que é ser livre?". Nunca poderei dar uma resposta, mas deixo aqui o que penso: cada um é tão livre quanto acredita sê-lo.


Ah, quanta vez, na hora suave

Ah, quanta vez, na hora suave
Em que me esqueço,
Vejo passar um voo de ave
E me entristeço!

Porque é ligeiro, leve, certo
No ar de amavio?
Porque vai sob o céu aberto
Sem um desvio?

Porque ter asas simboliza
A liberdade
Que a vida nega e a alma precisa?
Sei que me invade

Um horror de me ter que cobre
Como uma cheia
Meu coração, e entorna sobre
Minha alma alheia

Um desejo, não de ser ave,
Mas de poder
Ter não sei quê do voo suave
Dentro em meu ser.

Fernando Pessoa.

sábado, 9 de janeiro de 2010

The bluest eyes in Texas.

Assisti, nesses últimos dias, 3 filmes que me inspiraram a escrever este texto. O primeiro que vi foi O Corcunda de Notre-Dame, depois Crash e por último Meninos não choram. Quem já assistiu aos filmes deve ter uma idéia sobre o que escreverei. Sei que é um tema bastante clichê, mas eu quero deixar minha opinião mesmo assim.

É incrível perceber que em plena contemporaneidade, no século XXI, época em que máquinas se assemelham a humanos, ainda exista tanta intolerância e horror ao outro. Cada um tem seu próprio preconceito, é um fato inconteste; porém aterrador. Temos aversão à diferença. Não gostamos de nada que fuja da "normalidade". Existem aqueles que acham estranho o deficiente mental, dizem que é uma aberração. Já outros não gostam de negros, falam que são seres inferiores, com capacidade mental reduzida, e os jogam na vala comum, achando que todos são criminosos. Têm aqueles que possuem verdadeira aversão a grupos homossexuais, eu, por exemplo, já ouvi vários colegas falarem que é um nojo ver dois homens ou mulheres se beijando, e que gays são anomalias e merecem ser banidos da sociedade. E os preconceitos não acabam por aqui, estes acima citados são um pequeno exemplo.

Aí vemos que lutamos por tantas liberdades, mas não a temos verdadeiramente. Como podemos ser livres se tememos o que o outro pensa de nós? O deficiente mental tem de ficar em casa porque na rua as pessoas vão olhar e comentar o quão "bizarro" é. O negro não pode ser negro, ele tem de negar a sua cor, falar que é moreno escuro, mas nunca negro. O homossexual não pode assumir sua opção sexual, tem de escondê-la, porque é "pecaminoso" se relacionar com alguém que se ama se essa pessoa for do mesmo sexo. É tudo uma teia de falsas liberdades. Temos de ficar em nosso campanário, escondidos, pois o mundo lá fora é cruel. Ninguém que ser vítima de um ato de intolerância, por isso não podemos ser o que realmente somos; entre o "ser ou não ser", melhor não ser. Melhor não ter identidade própria. Neguemo-nos. Sejamos um vazio existencial. Uma ode a isso!

E de onde será que vem essa intolerância que nos tira a liberdade de sermos felizes? É algo que está intrínseco a nós? Cada pessoa nasce com um tipo de aversão ao semelhante? Aversão tão grande que é capaz de cegar e fazer com que não enxerguemos que aquele outro é também humano, que sente fome, frio, calor, dor? Uma vez, André Petry escreveu uma frase muito interessante: " [...] seres humanos não diferem de coisas só porque são um fim em si mesmos. Os seres humanos diferem das coisas porque, além de tudo, têm dignidade. As coisas têm preço." Concordo plenamente. Não somos objetos, coisas. Não temos preço. Somos seres que têm sonhos e anseios. Viver é, também, saber sofrer, mas não precisamos que alguém nos discrimine. Bastam as desilusões que temos diariamente.

Portanto, sejamos um pouquinho mais tolerantes e, assim, merecedores de nossa classificação como seres pensantes, seres humanos. Sei que esses preconceitos estão sendo desconstruídos. Os Estados Unidos, maior potência econômica do globo, que até a década de 1960 havia regime de segregação racial, elegeram um presidente negro. A Disney lançou recentemente um filme no qual a protagonista é uma negra do subúrbio de Nova Orleans. Alguns países já legalizaram o casamento gay, e casais homossexuais conseguiram realizar adoções. Mulheres são eleitas chefe de Estado com maior freqüência e conseguem empregos em ramos que eram exclusivamente masculinos. Contudo, essas mudanças ocorrem muito lentamente, ainda. A mentalidade conservadora de alguns e certas instituições impedem que o processo de desconstrução aconteça de forma mais rápida. Enquanto isso temos de viver em um canto escuro, onde podemos ficar imperceptíveis.

obs: Peço desculpas para aqueles que lêem o blog, se é que alguém o lê, pelo texto super clichê e entediante. Não pretendo escrever mais sobre esse assunto.


Ainda assim, eu me levanto

Você pode me riscar da História
Com mentiras lançadas ao ar.
Pode me jogar contra o chão de terra,
Mas ainda assim, como a poeira, eu vou me levantar.

Minha presença o incomoda?
Por que meu brilho o intimida?
Porque eu caminho como quem possui
Riquezas dignas do grego Midas.

Como a lua e como o sol no céu,
Com a certeza da onda no mar,
Como a esperança emergindo na desgraça,
Assim eu vou me levantar.

Você não queria me ver quebrada?
Cabeça curvada e olhos para o chão?
Ombros caídos como as lágrimas,
Minh'alma enfraquecida pela solidão?

Meu orgulho o ofende?
Tenho certeza que sim
Porque eu rio como quem possui
Ouros escondidos em mim.

Pode me atirar palavras afiadas,
Dilacerar-me com seu olhar,
Você pode me matar em nome do ódio,
Mas ainda assim, como o ar, eu vou me levantar.


Minha sensualidade incomoda?
Será que você se pergunta
Porquê eu danço como se tivesse
Um diamante onde as coxas se juntam?

Da favela, da humilhação imposta pela cor
Eu me levanto
De um passado enraizado na dor
Eu me levanto
Sou um oceano negro, profundo na fé,
Crescendo e expandindo-se como a maré.

Deixando para trás noites de terror e atrocidade
Eu me levanto
Em direção a um novo dia de intensa claridade
Eu me levanto
Trazendo comigo o dom de meus antepassados,
Eu carrego o sonho e a esperança do homem escravizado.
E assim, eu me levanto
Eu me levanto
Eu me levanto.

Maya Angelou.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Antieuclidiana, uma orquídea forma-se.

Enfim rompemos o ano de 2009, e 2010 chegou, trazendo consigo a renovação de nossas esperanças, como se tudo o que aconteceu ano passado se dissolvesse. As lágrimas derramadas, as misérias, as tragédias presenciadas, os escândalos políticos, as crises sociais e financeiras, tudo isso se desfaz, e emerge aquela sensação de que este novo ano será diferente. O Brasil finalmente vai dar certo. Inflamos o peito de orgulho! Fazemos promessas, renovamos os desejos e a esperança brilha em nossos olhos. Só que o ano passa, e vemos que tudo aquilo que era "festa" se acaba.

Acabam os sonhos de que neste ano as coisas seriam melhores, de que, enfim, iríamos nos livrar da corrupção que assola este país, de que as pessoas teriam um pouquinho mais de dignidade, de honestidade e seriam menos mesquinhas e egoístas. Mas o que acontece é o inverso: o meio-ambiente continua a ser destruído, as diferenças e preconceitos aumentam, a liberdade diminui, a violência continua apavorando e o povo sofrendo. Ah, este povo sofredor e esperançoso que é o brasileiro.

Somos o país da esperança. Nunca a perdemos, e, quando ela parece estar se apagando, vem o esporte nacional salvador: o futebol. Conquistamos mais um título, mais uma Copa, somos os melhores! Todos os problemas parecem sumir. Não há mais fome, miséria, violência, preconceito, não há mais nada. E o povo brasileiro se orgulha de não ter mais nada, porque o nosso bom e velho salvador da pátria teve mais uma conquista. Agora, estamos ainda melhor.Vamos sediar uma Copa do mundo e uma Olimpíada! O que mais poderíamos querer? O Brasil é o futuro, "ninguém segura este país". Batemos no peito com aquele nacionalismo ufanista para falar: "Sou brasileiro". Tudo é maravilhoso, o Rio de Janeiro continua lindo, continua sendo...Temos a Cidade Maravilhosa!

O pedinte do semáforo, a criança que morreu por inaninação na rua, o assaltante, o traficante, o desonesto, todos eles viram pó e são varridos pelo vento. Nada mais nos importa. Nossas esperanças estão renovadas. Afinal, é uma Copa do mundo em território nacional. Ora, não sejamos assim tão cegos. Na verdade, não somos cegos; simplesmente tapamos os olhos para aquilo que é incômodo. Criamos um grande muro para tapar nossa visão, e o enfeitamos com desenhos de giz, coloridos e utópicos. Aí não precisamos ver que do outro lado o muro está pichado em cores mortas, que há alguém já sem esperança, sem comida e sem dignidade; que deixou de ser humano em sua essência. Mas nisso não pensamos, é indigesto. Melhor pensar que em 2010 o Brasil ganhará pela sexta vez um troféu. Assim podemos dormir melhor à noite enquanto o outro morre, lentamente.

Por isso, inicio o ano de 2010 dessa forma: com um pé na utopia e o outro na realidade. Estou esperançoso, embora cético e irônico. Penso que podemos ser melhores em nossa individualidade, ser mais dignos, mais honestos, mais bondosos. Podemos acabar com alguns medos e preconceitos pessoais, deixar de ter aversão ao próximo. Desconstruir o muro de utopias, limpando cada desenho colorido levemente com um pano, descolorindo-o pouco a pouco. Depois pintamos o lado pichado, com pinceladas delicadas e leves, para em seguida derrubá-lo. E assim teremos um ano de 2010 recheado de sonhos, de esperanças e acontecimentos agradáveis.


Deus,
eu faço parte do teu gado:
esse que confinas em sonho e paixão,
e às vezes em terrível liberdade.
Sou, como todos, marcada neste flanco
pelo susto da beleza, pelo terror da perda
e pela funda chaga dessa arte
em que pretendo segurar o mundo.
No fundo, Deus,
eu faço parte da manda
que corre para o impossível,
vasto povo desencontrado
a quem tanges, ignoras
ou contornas com teu olhar absorto.
Deus,
eu faço parte do teu gado
estranhamente humano,
marcado para correr amar morrer
querendo colo explicação, perdão
e permanência.

Lya Luft.